Gabriela Caroline dos Santos
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) estimou o Valor Bruto da Produção Agropecuária (VBP) para 2022 em R$ 1,164 trilhão, resultado 4,5% acima do total registrado para 2021.
Em meio à pandemia, à guerra no Leste Europeu e a seus desdobramentos nas incertezas em relação à oferta e aos preços dos fertilizantes, somando-se a crise energética mundial, o horizonte pode parecer nebuloso para o agronegócio brasileiro em um primeiro momento. No entanto, segundo Aurélio Pavinato, presidente da SLC agrícola, a tendência da produção agrícola brasileira é manter sua trajetória de alta, mesmo que em um ritmo mais lento.
Nesse sentido, gestão de risco e planejamento, elementos importantes para qualquer tomada de decisão assertiva, são ainda mais relevantes para o produtor nos próximos anos. Culturas como cana-de-açúcar, café e laranja, fortemente impactadas pelo clima na safra anterior, devem, segundo José Carlos Hausknecht, da consultoria MB Agro, recuperar-se sobretudo a partir do segundo semestre.
A esse respeito, acompanhe abaixo as tendências de produção vegetal para o segundo semestre de 2022.
Tendências: aspectos gerais
Inicialmente, a previsão da safra de grãos feita pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) aproximava-se a 290 milhões de toneladas. Porém, com falta de chuvas, a quebra de produção de soja no Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Paraná levou a Companhia a reduzir a estimativa para um total de 269,3 milhões de toneladas. Somando-se a isso, há a tangível possibilidade de os efeitos do La Niña estenderem-se por relevante parte do ano agrícola.
Segundo o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), os custos da safra 2022/2023, semeada apenas a partir de setembro de 2022, já se apresentam mais elevados. O instituto estima que o custo operacional total para a produção de um hectare de soja suba de R$ 4.357,16 (safra 2021/2022) para R$ 6.146,03 no ciclo 2022/2023. No que se refere ao milho, a previsão é passar de R$ 3.563,51 para R$ 4.448,53 no mesmo período.
Assim, haja vista que a certeza do produtor, hoje, é um custo operacional mais elevado, é necessário que se planeje e verifique se vale a pena fazer determinado investimento.
Tendências: cana-de-açúcar
Na safra 2021/2022, o setor sucroenergético, influenciado pela seca, pelas geadas e pelos incêndios, produziu 568,4 milhões de toneladas de cana-de-açúcar. As consequências dessas intempéries, que afetaram sobretudo canaviais paulistas, podem impactar a nova safra, que se inicia em abril/2022.
Para analistas do Rabobank, a tendência é que os canaviais recuperem parte da produtividade perdida e que a nova safra seja mais alcooleira, estando as condições climáticas dentro da normalidade. De acordo com a Copersucar, o cenário para o setor do açúcar é de demanda aquecida e de boa remuneração.
Porém, com expectativa de recuperação parcial da produtividade dos canaviais, a tendência do setor sucroenergético é elevar a produção de etanol, em detrimento do açúcar. Isso pensando na cotação do petróleo, no real desvalorizado e na oferta limitada do produto, além dos créditos de descarbonização (CBIOs), devido a maior certificação do etanol para sua emissão.
Tendências: soja
Os efeitos do La Niña no clima da América do Sul causaram, na safra atual, prejuízos em culturas como soja, milho e feijão, além de café, cana-de-açúcar e laranja, que já vinham sofrendo com as mudanças no clima. A produção brasileira de soja teve revisão para baixo pela Conab, sendo estimada, atualmente, em 122,8 milhões de toneladas. O United States Department of Agriculture (USDA) emitiu as primeiras expectativas da produção norte-americana para a safra 2022/2023, semeada, no país, a partir de abril. A estimativa é de 122,2 milhões de toneladas de soja.
Tendências: milho
No mercado doméstico, as cotações do milho em grão estão firmes, sustentadas pela quebra da produção de primeira safra no país e por estoques menores. A expectativa para a produção da segunda safra é positiva, estimada em 86,1 milhões de toneladas pela Conab. Somando-se as três safras, a produção total está estimada em 112,3 milhões de toneladas.
Tendências: trigo
Haja vista o clima, a oportunidade de mercado em meio à guerra no Leste Europeu e a rentabilidade, o produtor rural do RS deve aumentar suas apostas na triticultura na próxima safra de inverno. A Conab estima que a área de produção de trigo do Brasil chegue, em 2022, a 2,8 milhões de hectares.
A guerra entre Rússia e Ucrânia envolve dois países que, em conjunto, respondem por cerca de 30% das exportações de trigo. Nesse sentido, preocupações com o déficit no fornecimento mundial do cereal alavancaram as cotações dos contratos futuros nas bolsas e no mercado brasileiro.
Ademais, segundo a Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), tendo em mente o prejuízo com a soja devido à estiagem, o trigo será a retomada da renda do produtor. Embora essa cultura tenha alto custo de produção para o produtor, os preços também estão altos. Outro fator a ser levado em consideração é o clima, pois a continuidade do La Niña favorece o cultivo do cereal.
No entanto, é importante ressaltar que o Custo-Brasil dificulta o abastecimento do mercado interno. Nesse sentido, por exemplo, para os moinhos do Nordeste, fica mais barato importar o trigo da Argentina do que transportá-lo desde o Sul.
Tendências: café
A guerra entre Rússia e Ucrânia tem pressionado as cotações do café, isso por conta das incertezas do consumo mundial, sobretudo no continente europeu. Desde o início do conflito, as cotações internacionais do grão despencaram. Segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), os preços do café do tipo arábica caíram mais de R$100,00/saca.
Entretanto, de acordo com especialistas, embora a tendência continue sendo de queda nos preços, o pior já passou. A colheita brasileira de 2022, que se inicia em abril/maio, trará os impactos da seca e da geada ao longo do último ano. Porém, com clima favorável, a safra de 2023, que começará a ser adubada em setembro/outubro, promete bons resultados, apesar dos custos altos de produção.
No contexto atual, os exportadores brasileiros buscam e estudam novos potenciais mercados para o café nacional. China e países árabes vêm sendo mencionados como destinos com potencial de serem melhor explorados.
Tendências: hortifrútis
De acordo com o Cepea, a preferência do consumidor por alimentos frescos embalados vem aumentando, pois passam mais segurança. Além disso, preocupações quanto à imunidade tendem a manter firme o consumo de alimentos saudáveis, como hortaliças e frutas.
Produção vegetal: tecnologias e insumos
É fato que o status brasileiro de potência agrícola está intrinsecamente ligado ao investimento em tecnologia e à utilização de corretivos do solo e fertilizantes.
O investimento no desenvolvimento de pesquisas para novas tecnologias é uma forte tendência em 2022. Sistemas para mapeamento de áreas, previsão climática, controle de maquinários e banco de dados de pragas e doenças são ferramentas de serviço e gestão imprescindíveis à sustentabilidade no campo. Isso porque a falta de conectividade no campo é um dos principais gargalos a serem superados, além de ser peça chave para otimização da produção.
Em relação aos fertilizantes, o Brasil rendeu-se, há tempos, a uma dependência que não será superada em curto prazo. Atualmente, esforços estão sendo postos em prática para o contato com exportadores potenciais e para a iniciativa do Plano Nacional de Fertilizantes.
No que tange às necessidades do vigente ano, com destaque para o segundo semestre, é preciso diversificar e racionalizar o uso de fertilizantes na próxima safra. Para isso, a Embrapa, a partir de abril/2022 até abril/2023, enviará técnicos a 30 polos agrícolas, cobrindo 90% da área plantada do país. Denominada Caravana FertBrasil, a iniciativa levará conhecimento sobre a correta avaliação do solo e dosagem de adubo, visando elevar a eficiência do produto, em média, em 10%.
Haja vista todo o cenário, essa pode ser a hora e a vez de o Brasil deixar para trás a dependência externa de insumos cruciais à sua agricultura.
Escrito por Gabriela Caroline dos Santos
Referências
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